Reinventando Duas Vezes sua empresa: Navegando no mar revolto do Coronavírus

São os mares revoltos que produzem os bons marinheiros.
 
Ou algo assim.
 
De uma hora para a outra, fomos obrigados a entrar em um oceano mais que revolto. Se empreender já é um desafio por sua própria natureza, o Universo fez a gentileza de nos colocar um desafio ainda maior. Consigo até ver o Senhor do Universo falando: “Agora vamos ver se são bons mesmo!”
 
Resiliência é a palavra da vez. Quem não se lembra do filme do “Rocky, o Lutador”, onde o protagonista apanhava, apanhava, e continuava de pé? E, quando caía, levantava-se rapidamente e voltava ao combate. Uma das características mais importantes em um empreendedor é sua resiliência, sua capacidade de assimilar os golpes e continuar lutando, e não desistir. Nunca.
 
Houve uma vez um jovem cujos professores disseram a seus pais que ele era “muito estúpido para aprender alguma coisa”. Foi demitido de seus dois primeiros empregos por ser “pouco produtivo”. Então, esse rapaz decidiu empreender. Esse jovem empreendedor americano chamava-se Thomas Alva Edison. Montou sua empresa e registrou 1.093 patentes, sendo 512 patentes mundiais. Sem dúvida um dos mais notáveis inventores da história, um gênio.
 
Mas teve uma das invenções de Thomas Edison que nos deixou uma grande lição. Quando sua equipe trabalhou em um projeto para melhorar e aumentar a estabilidade das lâmpadas de filamento incandescente, que já existiam há mais de 40 anos, fizeram exaustivos testes e experimentos. Foram mais de 2,000 testes até se chegar a um projeto experimental com estabilidade de funcionamento. Isso sim é prova de resiliência. E quando disseram a ele que seu time não teve competência suficiente pois teve de realizar 2,000 tentativas com mais de 6,000 tipos diferentes de filamentos para chegar a uma única alternativa correta, ele logo retrucou: “Nossa equipe descobriu 2,000 maneiras de como não se deve fazer uma lâmpada incandescente, para que chegássemos a uma maneira correta, pois a falha faz parte do processo de construção do acerto”.
Hoje estamos passando por uma situação onde fomos forçados a sair de nossa zona de conforto. Depois de anos de trabalho e persistência, cada um chegou a seu modelo de negócio, colocou sua empresa para funcionar e ajustou seus processos. Quando tudo aparentemente estava em equilíbrio, surge um tal de coronavírus e temos que recomeçar tudo outra vez.
 
A situação faz com que tenhamos, na mesma empresa, três modelos de negócio distintos. O modelo “ACV”, ou seja, “Antes do Coronavírus”, o modelo “DAQ”, que seria “Durante a Quarentena”, e o modelo “PCV”, que significa “Pós Coronavírus”.
 
São três modelos de negócio diferentes. Sua empresa, da maneira como ela funcionava antes do coronavírus, na maior parte dos casos nunca mais voltará a existir, pois de uma hora para outra o mundo mudou, a sociedade mudou, as interações mudaram, e sua empresa foi obrigada a baixar momentaneamente as portas de uma maneira ou de outra. Com isso, embarcamos forçados no modelo “DAQ”, “Durante a Quarentena” atirados à revelia, sem alternativas de nos mantermos no modelo anterior. Estamos agora no meio do período de quarentena, isolamento social, distanciamento social… e tendo que gerar faturamento.
 
Este é o primeiro momento de reinvenção.
 
Neste momento, o empreendedor deve pensar em seu modelo de negócio não como era, mas como deve ser agora, para que os danos sejam os menores possíveis e de alguma forma possa superar esta transição para que, finda a quarentena, volte a operar em condições menos desfavoráveis.
 
Nesta primeira reinvenção, o empreendedor deve privilegiar seu fluxo de caixa tentando adiantar recebíveis, postergar e renegociar seus pagamentos e dívidas, gerar receita e gerir seus estoques. Principalmente, deve pensar de qual forma continuará a operar, mesmo que de forma reduzida, visando gerar alguma receita e minimizar os danos. Deve ainda pensar em como manter seu capital humano, pois demitir e mais à frente recontratar certamente sairá mais caro pois ainda terá que treinar e qualificar sua mão de obra, o que fará com que a capacidade de produção venha a ser comprometida. Então esta é sua nova empresa no momento da transição, muitas vezes com atividades e operações bastante diferentes do momento pré-coronavírus.
 
Para citar um exemplo, um cliente de minha empresa, uma sorveteria de pequeno porte, teve que fechar suas portas da noite para o dia, como todos nós. Os donos, um casal de estrangeiros, não sabiam o que fazer visto que o negócio girava com capital apertado, e aqui nos Estados Unidos a folha de pagamento é semanal ou quinzenal, o que dá pouco prazo para manobras. Utilizaram o seguinte raciocínio, fazendo uma análise com uma das ferramentas mais básicas de planejamento estratégico, mas extremamente eficaz – a análise SWOT. Internamente, quais são nossos pontos fortes, e externamente quais as oportunidades que temos? O que podemos fazer com nossa infraestrutura existente, já que sorvetes são dificílimos de serem entregues à domicílio pois teríamos que ter embalagens térmicas adequadas, e não tivemos tempo para encomendar? Bom, temos nossa cozinha preparada e equipada, e nosso pessoal treinado para opera-la.
 
E qual a oportunidade que o mercado nos oferece em meio a essa crise? As pessoas terão que se alimentar em suas casas pois os restaurantes foram fechados. Excelente – vamos então produzir refeições para entrega à domicílio, com apelo de utilização de ingredientes saudáveis pois existe grande preocupação com saúde neste momento. Ainda, vamos utilizar motoristas de Uber que estão ociosos devido à restrição de utilização deste tipo de serviço, e assim auxiliamos a eles também para que gerem renda neste momento delicado.
 
Uma tarde de pensamento criativo, e estão faturando mais do que com a sorveteria. Acreditem.   
 
Nossa lição de casa agora é corrermos para planejar e elaborar a segunda transformação de modelo de negócios, em menos de 90 dias: o momento “PCV” – Pós Coronavírus.
 
Este modelo de negócios pode até ser parecido com o modelo anterior à crise; mas necessariamente não terá como ser igual. O mundo mudou, hábitos antigos mudaram, novos hábitos se formaram, as preocupações serão outras pois teremos ainda distanciamento social, prevenção contra contaminação, preocupação maior com saúde e asseio, poucas aglomerações, maior interação digital.
 
O momento que se aproxima será outro – estaremos voltando ao “normal”, mas não ao mesmo “normal”. Vamos voltar a um “novo normal”, bastante diverso do que era.
Então, se você está pensando em retornar ao “antigo normal” com o mesmo modelo de negócios que possuía, você já estará, em 90% dos casos, recomeçando errado. Pare e repense seu negócio, para sobreviver.
 
Bem-vindos à Era da Resiliência!

ANDRÉ VACCARO
Consultor de Empresas, Diretor da ABCO – Associação Brasileira de Consultores – Núcleo Florida/USA.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Assuntos relacionados